Arquivo para crime

Nova estratégia de campanha pró José Serra: Cyber-Jagunços.

Posted in Nosso Mundo, Vida Digital with tags , , , , , on agosto 20, 2010 by Daniel Duende

A primeira ameaça de morte via twitter a gente nunca esquece, ou assim (quase) diz o ditado. Mas eu desconfio que daqui a alguns dias eu nem vou mais lembrar deste momento carinhoso da interação social digitalmente mediada, portanto achei importante publica-lo aqui para a posteridade (até porque o meu possível futuro assassino deve apagar as ameaças em breve, se tiver algum bom senso).

Tudo começou quando notei as declarações de péssimo gosto, criminosas mesmo, feitas pelo twitteiro @peaodefabrica, que tem todas as característica de ser mais um daqueles Trolls que a equipe de campanha de José Serra insiste em contratar (apenas 11 seguidores, aparencia estereotipada de “povo”, fazendo SPAM das mesmas mensagens agressivas anti-petistas repetidas vezes). Reproduzo abaixo a declaração inicial do sujeito, que você lê aqui se não tiver sido retirada do ar:

O PT de São paulo ta de brincadeira com o povo lançou uma chapa de senadores com uma PROSTITUTA e um MACACO, tenha paciencia!!!!

Quando questionado sobre suas declarações, evidentemente difamatórias (que me perdoem as profissionais do sexo) e racistas (sem ofensa aos primatas cuja raça dá teor ao xingamento), contra os dois candidatos do PT em São Paulo, o twitteiro @Peaodefabrica me respondeu com as seguintes amostras de sua índole (ou, quem sabe, do fim para o qual foi contratado):

Dizem que cão que ladra não morde, mas por via das dúvidas já denunciei a ameaça às autoridades competentes, e todas as evidências já estão guardadas em local seguro.

Se José Serra tem gente assim fazendo campanha para ele, imagina o tipo de gente que integraria seu governo se virasse presidente? Pior ainda, se gente assim quer votar em José Serra, deve ser porque acredita que no governo Serra vai poder usar impunemente da força pra calar a boca dos outros. Opa, não é isso mesmo que José Serra fez com todos os manifestantes que tiveram a “ousadia” de discordar dele durante seu governo?!? Nosso amigo tem razão. Gente como ele só vai ter vez mesmo no governo do José Serra. Ou talvez não, porque tudo indica que trabalhadores de fábrica não estejam na lista das “classes beneficiadas” pelo projeto de Brasil de Serra.

@Peaodefabrica é a cara de seu candidato José Serra. É truculento, não sabe discutir e não parece entender muito de internet (pra não entender as consequências de ameaçar alguém publicamente no twitter). Quando Cthulhu for presidente, tenho certeza de que vai dar um jeito neles dois. Eu hein!

“Como esconder um pedófilo de batina?”

Posted in Nosso Mundo with tags , , , , , , , , on março 22, 2010 by Daniel Duende

Acabei de perceber que algumas pessoas vieram parar neste blog (via gúgou) em busca do “Crimen Solicitaciones”, um documento da igreja datado de 1962 que orienta as paróquias a lidarem com os casos de “crime de solicitação” — um eufemismo para violência sexual — praticado por padres. O documento foi aparentemente redigido por um tal Joseph Ratzinger (curiosamente, este também era o nome usado pelo Papa Bento XVI antes de se tornar o atual lider da Igreja), e orienta os procedimentos de transferência do padre para outra paróquia, contatos intimidadores com a família da vítima (que pode ser até ameaçada de excomunhão caso leve o caso à justiça) e arranjos a serem feitos junto às autoridades. O documento termina com os modelos de rito de admissão de culpa (do padre), caso todas as outras artimanhas falhem.

Baixe aqui o Crimen Solicitaciones em inglês, copiado de um fax que circulava internamente pelas Igrejas da cidade de Boston, nos EUA. Nos últimos 20 anos, foram registrados mais de 10.000 casos de violência sexual de padres e outros oficiais da Igreja contra crianças nos Estados Unidos.

O que dizer de uma instituição religiosa que acoberta estupradores de mulheres e crianças fiéis à sua crença, e ainda os provê novos contatos privilegiados com potenciais vítimas APÓS constatar os crimes, em vez de entregá-los à justiça?

Para saber mais sobre violência sexual na Igreja, leia este velho roundup que escrevi pro Global Voices.

Eu deliberadamente resolvi não comentar as últimas notícias sobre violência sexual por parte de padres, que agora aparecem timidamente na mídia. Isso não devia mais ser tratado como novidade, e fazê-lo apenas nos dá a falsa impressão de que estes terríveis crimes acobertados pela Igreja são algo novo ou isolado. Não são! Acontecem todo dia, em todo lugar, e a Igreja só não é punida por seu acobertamento histórico destes crimes porque os estados laicos ocidentais não tem coragem de enfiar a mão neste vespeiro, limitando-se a punir um ou outro padre cuja notoriedade vai além do alcance do manto protetor da Igreja. Se vivemos em um país onde dificilmente um político é punido por seus crimes, imagine então o poder de impunibilização da mais antiga instituição política ainda em atividade no Ocidente: a Igreja. Eles podem tudo há mais de 1500 anos, e são responsáveis por cometer e acobertar tantos crimes que não seria possível lembrá-los a todos nem que pudéssemos. A justiça divina deve estar tendo um trabalhão lá do outro lado…

Media et Circensis

Posted in Nosso Mundo with tags , , , , , , on março 16, 2010 by Daniel Duende

Já falei disso exaustivamente lá no meu tuíter, mas nunca é demais marcar uma posição sobre este tema. Acho deprimente a maneira como a mídia tradicional (mesmo em sua versão online) está tratando a morte do cartunista e padrinho do Santo Daime Glauco Villas Boas. Primeiro se preparou para transformar o crime em mais um “libelo contra a violência urbana” (ou mais especificamente, contra os pobres, que geralmente são os únicos culpados pela violência aos olhos da mídia tradicional). Depois, quando viu que estava enganada sobre o crime e sua autoria, resolveu transformar o autor do assassinato em “monstro”. Mas mudou rapidinho de alvo, e por fim resolveu eleger um culpado bem previsível: O Santo Daime. Tudo errado.

É a mídia brasileira dando a sua já famigerada sucessão de bolas-fora, em um já tristemente comum show de ignorância e afã de “informar” rápido, mesmo que falando besteira e desinformando. Apurar quem deve ser na verdade o tal rapaz que deu os tiros em Glauco, ou tentar entender mais sobre o Santo Daime perguntando para quem entende, parecem estar fora de cogitação. Vale mais fazer um perfil leviano do “assassino”, baseado em algumas poucas palavras ditas sobre ele aqui e ali, para depois levantar uma série de quesitonamentos para lá de estúpidos sobre uma das religiões mais mal compreendidas do país.

O Santo Daime não é uma bebida alucinógena como sugerem alguns jornais e seus leitores. Alucinógeno é um termo médico-farmacológico usado para designar uma substância que causa alucinações. Afirmar que o Daime é alucinógeno, e portanto taxar uma experiência religiosa por ele propiciada como “alucinação”, é a mesma coisa de falar que o a fé cristã é psicotomimética (substância ou prática que leva o indivíduo a apresentar sintomas psicóticos) por conta dos êxtases religiosos, relatos de curas milagrosas e de sonhos inspiradores de seus fiéis. Mas isso ninguém faz, claro. Falar mal da religião que metade do Brasil finge que segue (seja na versão católica ou na versão evangélica) não pega bem, mas chamar o chá sagrado de uma religião pequena e incompreendida de “alucinógeno” está muito bem. Parabéns pelo belo espetáculo de preconceito! A mídia brasileira mostra mais uma vez a sua mediocridade e burrice.

Ao mesmo tempo, chamar o assassino de Glauco de louco é quase a mesma coisa que dizer que ele matou sob influência de drogas. Na melhor das hipóteses, um juízo precipitado, tendo em vista que não se sabe com clareza o que aconteceu. Na pior das hipóteses, é uma afirmação sensacionalista para vender jornal mesmo. E quando se junta um “louco em potencial” com uma “religião pouco conhecida e misteriosa”, você tem um prato feito para a voracidade circense da mídia. Adicione a isso que estes dois elementos estão somados à lamentável (MESMO!) morte de um importante e controverso artista brasileiro, e você tem a bola da vez de nossa imprensa.

Mais do que isso, a busca por explicações fáceis e bodes expiatórios vai além das necessidades mercadológicas dos jornais. Ela tange também a nossa necessidade de olhar para o outro lado quando nos deparamos com a complexidade humana. Ninguém quer ver que somos complicados e imprevisíveis. Ninguém quer ver que gente como a gente pode matar gente como a gente. Prefere-se encontrar um motivo fácil, seja ele a loucura (que para muitos é o rótulo perfeito para colocar uma distância entre “eu” e “ele”) ou a tradição religiosa pouco conhecida seguida por vítima e algoz. Aliás, para quem não sabe, para muitos o Santo Daime é uma religião difícil de seguir, justamente porque o chá nos faz confrontar sem grandes escapatórias às complexidades de nossa condição humana. Uma grande ironia, principalmente quando se vê tanta gente ignorante tuitando piadas sobre “tomar um copo de Daime”.

Glauco Villas Boas era líder de um centro do Santo Daime há muitos anos. Era muito querido pelos frequentadores deste centro. Alguns deles me falaram coisas maravilhosas a seu respeito. E em meus quase 10 anos de residência em uma comunidade do Santo Daime, pude ver como o chá e a doutrina faziam bem a muitas pessoas ali. Para alguns, não era bem o que procuravam, e estes passavam por lá e iam embora, e seguiam sua vida. Para outros, era o verdadeiro Santo Graal, a chave para curas maravilhosas. Mas nada disso importa para boa parte das pessoas que não fazem até hoje idéia do que é aquela doutrina. O Daime é esquisito para o cidadão-médio-que-finge-que-é-cristã0-e-direito, e por isso se alguém ligado ao Daime foi morto por outra pessoa ligada às religiões ayahuasqueras, então a culpa deve ser do chá. Tão simples que até um peixinho beta poderia pensar assim, e olha que eles não são muito brilhantes.

É por essas e por outras que eu digo “ê povinho bunda esse pessoal que acredita nos jornais!”. Quer uma dica? Se não quer saber a respeito do mundo que te cerca, ao menos assuma sua ignorância em vez de vomitar verdades enlatadas consmidas alí na esquina. Somos todos ignorantes em algumas coisas, mas alguns de nós tem o grave defeito de ignorar a própria ignorância. =)

UPDATE:

E se você acha que estou pegando pesado demais, convido você a ter um olhar perspectivo sobre um circo midiático do passado que tem algumas semelhanças a com este. Não se trata só do Glauco (vá em paz, padrinho Glauco!), ou do Santo Daime (doutrina na qual eu mesmo não me encontrei, mas que respeito acima de qualquer outra religião que já conheci). Trata-se de perceber a retroalimentação perversa que existe entre a mídia que não se preocupa em informar e o público que não quer realmente saber. Vira palhaçada, vira circo, e quem ocupa o picadeiro são as vítimas e os bodes expiatórios que consumimos junto com o café da manhã. E no fim da estória, quem fica mais rico é o dono do jornal, e o nariz vermelho de palhaço continua onde sempre esteve: na sua cara.